Avaliação processual de qualidade.
Um sistema muito interessante de avaliação processual de qualidade é o chamado RAND system que avalia condições agudas ou crónicas que representam as principais causas de doença, morte e utilização de recursos em cada grupo etário, assim como cuidados preventivos relacionados com essas causas.

Inclui indicadores de qualidade para todas as fases de cuidados ou funções dos médicos: rastreio, diagnóstico, tratamento e seguimento, prevenção. Avalia potenciais problemas como o sobre- ou sub-uso de processos-chave.

Escolhe medidas processuais como indicadores (não necessitam de ajustamento de risco).
- O que está a ser feito (tipo de cuidado): para doença crónica, aguda, prevenção.
- Porque está a ser feito (função): tratamento, diagnóstico, rastreio, seguimento.
- Como está a ser fornecido (modo): história, encontro, testes, medicação, cirurgia, aconselhamento, imunização.
-Natureza do problema de qualidade: sobre ou sub-uso.

Alguns exemplos das muitas variáveis discriminadoras em patologias seleccionadas:

Asma (25 indicadores)
- Uso de agentes de longa duração para doentes com uso frequente de agonistas beta de curta duração. (sub-uso) (terapêutica)
- Uso de corticóides inalados para doentes a receber corticóides sistémicos a longo prazo. (sub-uso) (terapêutica)
Doença cerebrovascular (10 indicadores)
- Uso de antiplaquetários para AIT ou AVC não cardíaco. (sub-uso) (terapêutica)
- Doppler carotídeo para doença cerebrovascular ou AIT. (sub-uso) (diagnóstico)
Insuficiência cardíaca (36 indicadores)
- FE antes da terapêutica. (sub-uso) (diagnóstico)
- IECA's se FE menor que 40.(sub-uso) (terapêutica)
Doença coronária (37 indicadores)
- Aconselhamento de abstinência tabágica. (sub-uso) (terapêutica)
Diabetes (13 indicadores)
- Aconselhamento de dieta e exercício. (sub-uso) (terapêutica)
- IECA para doentes com proteinúria. (sub-uso) (terapêutica)
Dislipidemia (7 indicadores)
- Tratamento LDL>100 mg/dl na doença coronária.(sub-uso) (terapêutica)
Hipertensão arterial (27 indicadores)
- Mudança de terapêutica quando pressão arterial não controlada.(sub-uso) (terapêutica)
Cuidados preventivos (38 indicadores)
- Rastreio de problemas com o álcool. (sub-uso) (rastreio)
- Vacinação antigripal >65 anos.(sub-uso) (terapêutica)

É claro que nesta avaliação é necessário ter em conta as contra-indicações e outros potenciais modificadores de decisão. Por exemplo para os bloqueadores beta na insuficiência cardíaca pode haver contra-indicações que impeçam o seu uso e portanto a sua não prescrição não é falta de qualidade mas sim o contrário. É importante o registo pelo médico de que a medicação foi considerada mas não pôde ser utilizada.

Nesta avaliação pode haver tanto falsos-negativos (medicar na consulta e não registar, aconselhar abstinência tabágica e não escrever no processo) como falsos-positivos (registar procedimentos que não se realizaram, nomeadamente no exame físico). Por exemplo, num estudo só 15% tinham registo de vacina anti-gripal mas 85% dos doentes (na entrevista) tinham-na feito.

A avaliação da qualidade num estudo realizado nos EUA utilizando este sistema foi publicado em 2003 no NEJM (Volume 348: 2635-2645), e concluiu pela frequente não aderência aos processos recomendados.

Pedro von Hafe